Como tornar painéis solares mais eficientes?

Em seu doutorado, a gaúcha Natasha Gruginskie pesquisou como fazer painéis solares produzirem mais energia elétrica e durarem mais tempo.

“Ao longo do ensino médio eu não tinha nem ideia do que queria fazer.” Quem olha para a carreira de sucesso de Natasha Gruginskie nem imagina que ela, como muitos de nós, também teve muitas dúvidas sobre uma futura profissão quando era adolescente. A gaúcha de Porto Alegre foi muito estimulada por seu pai a estudar e a ter curiosidade pelo mundo a sua volta desde que era criança. Então, desde cedo, ela já cogitava ir para a área acadêmica. Ela só não sabia qual. “Pensei em fazer muitos cursos diferentes: arquitetura, química, nutrição.” Mas foi sua aptidão e inclinação pela área de exatas que a fizeram escolher Engenharia de Energia.

Durante a graduação, acabou apaixonando-se pelo potencial de pesquisa e inovação introduzidos em algumas disciplinas. No fim da faculdade, já não se via fazendo outra coisa além de ser cientista. Sendo assim, após a graduação, a decisão de fazer um mestrado veio de maneira natural. Ela, então, optou pelo mestrado em Engenharia de Materiais em sua cidade natal. E no doutorado, ela decidiu aplicar esses conhecimentos em outra área de interesse: as energias renováveis.

Diferentes tipos de energias renováveis. Fonte: iStock.

As energias renováveis são aquelas que vem de fontes naturais ilimitadas, ou seja, que são constantemente reabastecidas. Entre elas, estão o sol, a chuva, o vento e as marés. Em seu doutorado, Natasha focou na melhora de equipamentos que são usados para captar energia solar e convertê-la em energia elétrica, os chamados painéis solares. Apesar de já existirem no mercado, estes painéis não são totalmente eficientes em gerar energia elétrica. Além disso, a eficiência de gerar energia diminui com o tempo, além de que eles podem ser bem caros para serem produzidos.

Sendo assim, em seu doutorado em Ciências de Materiais pelo programa Ciências Sem Fronteiras na Universidade Radboud, em Nijmegen-Holanda, Natasha estudou como fazer com que painéis solares produzissem mais energia elétrica. Estes painéis são compostos por unidades chamadas de células solares. No seu estudo, Natasha e seus colegas fizeram várias mudanças nestas células a fim de testar se elas poderiam se tornar mais eficientes. “Mudando um pouco a estrutura dessas células, elas geram quantidades diferentes de energia. Analisando bem essa relação, a gente tentou descobrir qual era a configuração mais eficiente,” explica Natasha.

Fonte: Solar Resource Application platform

As células solares são formadas por um material semicondutor que é capaz de absorver energia da luz do sol. Vamos pensar na luz solar como um raio composto por partículas bem pequenas, os fótons. Já nas células solares, como uma rede feita do mesmo material. E as ligações químicas entre estes materiais são o que mantem a rede conectada. Quando um destes fótons colide com a rede com energia suficiente, ele pode deslocar um elétron da ligação química da rede. É como se fosse uma bolinha de gude batendo em outra, quando a bolinha que foi arremessada ocupa aproximadamente a posição da bolinha que foi deslocada. Mas aí o que acontece com o elétron que é deslocado, aonde ele vai parar? Devido a composição da célula solar, que também conta com um campo elétrico, este elétron que foi deslocado é atraído para uma parte metálica da célula. Pelo metal ser um material condutivo, ou seja, que pode conduzir energia, este elétron e tantos outros que foram deslocados, agora são transportados para um circuito elétrico através do metal, gerando corrente elétrica.

Fonte: U.S. Energy Information Administration

O material semicondutor presente nas células solares pode ser formado por diferentes elementos químicos. O mais comum, usado nos painéis solares residenciais, é o silício. Este material, por ser bastante abundante na Terra, é relativamente barato, por isso mais usado em aplicações cotidianas. No entanto, este tipo de material não é tão eficiente energeticamente. Um outro material, mais caro, mas também mais eficiente que o silício é o arseneto de gálio (GaAs). Tal material é utilizado principalmente em aplicações espaciais, como satélites e sondas. “Estes satélites são, na maioria, muito importantes para a nossa comunicação, para transmitir ondas de rádio, sinal de GPS e até internet,” explica Natasha. Além disso, ele vem sendo aplicado em carros, drones e pseudosatélites.

Mesmo sendo mais efetiva, a conversão de energia solar em elétrica não é completa com células de GaAs. “A eficiência recorde de células solares de GaAs é de 29.1%. Se a energia média que vem do sol é de 1000 Watt/metro quadrado, uma placa solar de 1 metro quadrado seria o equivalente a um gerador de 291W. Ao olhar a nossa conta de luz, a gente vê um consumo em “kWh”, ou seja, podemos comparar essa potência de geradores multiplicado pelas horas de sol, para saber quanto precisaria para gerar energia o suficiente pra nossa casa. Se tivéssemos 8 horas de sol nesses painéis, em um dia teríamos uma geração de 2.3 kWh. Para comparação, na minha casa a gente usa mais ou menos 3.5kWh por dia,” explica Natasha. 

Portanto, para que se tornem energeticamente mais eficientes, estudos que visam aprimorar estas células solares são essenciais. “Melhorar a produção de energia de células solares garante que elas sejam mais confiáveis e resilientes nas aplicações, diminuem o custo final e aumentam a autonomia das tecnologias alimentadas por elas, além de ser uma fonte de energia renovável,” explica Natasha. Além disso, a “geração de energia solar de alta eficiência pode também facilitar o desenvolvimento de outras tecnologias, como drones autônomos, carros solares, eletrônicos que podem ser carregados off-grid, etc,” completa a cientista.

Natasha em um dia de trabalho. A vestimenta serve para garantir um ambiente o mais limpo o possível para trabalhar com as células solares.

Portanto, em seu doutorado, Natasha estudou como o design das células solares compostas por GaAs afeta a produção de energia e a durabilidade, especialmente no ambiente espacial, onde estas células são mais utilizadas. “Eu fabriquei muitas células solares, variando certos aspectos do seu design e analisei seus resultados. Usei modelos teóricos para tentar entender o comportamento da luz e dos elétrons dentro das células. Além disso, simulei as condições do ambiente do espaço, como altas temperaturas, bombardeamento de prótons e de elétrons, e avaliei como isso afetava a vida útil desses dispositivos.”

Como você pode imaginar, bastante energia é necessária para levar qualquer objeto ao espaço. Em termos práticos, isso significa bastante dinheiro. Portanto, o peso das células solares e, consequentemente, dos painéis solares, é um fator limitante. Sendo assim, uma característica do design das células solares que foi estudado e modificado por Natasha foi o peso.  Uma maneira que pode diminuir tanto o peso quanto o custo é a introdução de um espelho na célula solar. Este é utililizado com o intuito de concentrar os raios solares, o que faz com que uma menor área seja necessária e, portanto, menor peso e custo. Outra maneira é simplesmente utilizar um material mais leve. No caso de Natasha, ela utilizou um tipo de material chamado de filme fino na fabricação das células.

Natasha na Universidade Radboud, onde fez seu doutorado.

Aplicando estas modificações, ela e seus colegas avaliaram como estas células solares experimentais reagiam a um ambiente que simulava o espaço, principalmente em relação à eficiência energética e à durabilidade. Como fruto destas análises, Natasha e seus colegas já publicaram vários artigos, nos quais eles avaliaram diferentes aspectos das células solares. Entre estes artigos, em um publicado este ano, os pesquisadores investigaram como a irradiação de prótons vindos do espaço “fictício” afetava o desempenho das células solares. Baseados nos resultados, os pesquisadores puderam concluir que a utilização de filmes finos faz com que as células solares tornem-se também mais finas. Na prática, isso acaba as deixando mais resilientes a danos por radiação. Nos outros artigos, eles avaliaram como a irradiação de elétrons e a temperatura afetam estas células solares experimentais. Além disso, aspectos mais técnicos e design das células também foram testados.

Natasha fazendo os testes com as células solares.

E estes estudos não param por aí. Hoje em dia, Natasha continua trabalhando no mesmo laboratório, mas agora como postdoc. Quando perguntada sobre o que a motiva a continuar sendo cientista, ela não hesita: “Progresso. Eu acredito que tecnologia é a grande força que vem melhorando a qualidade de vida da humanidade, e eu tenho a oportunidade de contribuir para isso. Energias renováveis e exploração espacial são, na minha opinião, duas frentes de pesquisas que estão alavancando a ciência atualmente. O fato de que eu estou envolvida nessas áreas é inspirador para mim.”

Quando não está fabricando células solares ou analisando seus dados, Natasha gosta de fazer trabalhos manuais, como pintar, fazer seus próprios cadernos e reformar pequenos móveis. Além disso, gosta de correr e fazer exercícios físicos.

Muito obrigada por nos contar a sua história, Natasha! Que você possa continuar contribuindo para o avanço científico e tecnológico por muito tempo!

Você pode continuar a acompanhar a carreira de Natasha aqui.

Leave a Reply

Fill in your details below or click an icon to log in:

WordPress.com Logo

You are commenting using your WordPress.com account. Log Out /  Change )

Twitter picture

You are commenting using your Twitter account. Log Out /  Change )

Facebook photo

You are commenting using your Facebook account. Log Out /  Change )

Connecting to %s